domingo, 3 de abril de 2011

Educadores sociais podem "solucionar" Salvador ?




O educador se constrói constantemente no ato educativo, no relacionamento com seu educando, no dizer sim, no dizer não. Ele enfrenta o tempo todo a pergunta que o incomoda, e, que deve incomodar; "Sou Educador?" É nesse questionamento, não da sua competência, mas da sua significação, que se dá diferenciação entre a pessoa que exerce o ato educativo e o cargo de quem trabalha com educação ou num projeto social. Ao ir para a rua, outra importante indagação surge à sua frente: "Decifra-me ou devoro-te". A rua, com sua articulada estrutura convida-o para o embate.


Não é mais aquele espaço solto, bagunçado, movimentado, mas sim um espaço onde as coisas estão definidas, onde os atores sociais executam e exercem os seus papéis de forma ordenada e correlacionada. Os meninos e meninas, os cafetões, os rufiões, as prostitutas, os drogados, o moço da farmácia, a vizinha, o feirante, o policial militar, todos, perfeitamente todos estão numa sincronia e é nela que o educador deve se encaixar. Ele é o estranho, o invasor, o de fora, aquele que vai alterar um determinado ritmo das coisas e trazer à tona, num aberto quadro de enfrentamento, questões que outros prefeririam não ver, quanto mais, enfrentar. O Educador Social contribuirá para deflagrar um processo que é ao mesmo tempo diferente, complexo e profundamente transformador.

O Educador tem então que despertar nestas crianças e adolescentes o desejo pela transformação da sua realidade, ultrapassando a cruel visão daquilo que é real e partindo para o campo do desejo, onde projetos e propostas de vida deverão ser construídos. O Educador então se deparará com obstáculos que dificultarão a elaboração destes projetos; a família com laços estremecidos ou rompidos, a escola não adequada e capacitada para atender este tipo de clientela, a sociedade que não lhes dá uma oportunidade para emprego, estágio ou capacitação.

Como foi dito anteriormente, para iniciar o seu trabalho, o Educador deve conhecer a rua, penetrar no seu cotidiano, identificar os diferentes atores que compõem aquela cena, identificar a criança ou adolescente, alvo da sua ação, observando a dinâmica estabelecida por este e em relação aos outros atores. Esta primeira fase é o momento em que o educador busca construir o vínculo com a criança ou adolescente. Para atingir esse objetivo utiliza-se jogos, revistas ou livros, técnicas de troca de olhares, falas espaçadas etc. Depois estabelecido o vínculo, ainda que frágil, o Educador deve iniciar o estabelecimento de relação de confiança. É preciso mostrar ao educando a figura do Adulto Positivo, aquele que pode-se apresentar enquanto a pessoa disponível para auxiliá-lo na construção do seu projeto de vida. Por meio de atividades mais complexas do que aquelas anteriormente mencionadas, o Educador vai “apresentando” um mundo para o educando visando despertar neste a sua própria forma de ver e interpretar este mesmo mundo. Passeios, minipalestras, bate-papos sobre diversos temas como Aids, Drogas, Sexualidade, também são uma boa maneira para concretizar esta aproximação. Aqui não é utilizado o termo Abordagem, comumente encontrado em orientações programáticas, visto que este termo é interpretado no senso comum como a prática utilizada pelo policial à rua, abordando um elemento suspeito. O Educador não aborda, ele se aproxima, ele busca manter contato, ele atraí e é atraído para uma relação de confiança e não de suspeição.

O educador deve não só estimular a estruturação do projeto de vida por parte do educando, mas acompanhar seus primeiros passos nesse novo momento de vida, de forma que ele se sinta seguro e apoiado.
Esta é uma fase delicada, porque uma das pré-condições para que o projeto de vida dê certo é o/a educando/a não estar na rua, nem fazendo vida. Inicialmente eles terão dificuldade em aceitar estes termos, temerão deixar de ganhar dinheiro, para ter que batalhar um trampo, onde com certeza ganhará menos. Por isso, também, as alternativas sociais deverão estar engatilhadas de modo que exista uma rede de apoio a ação do educador, não só por parte da entidade que o mesmo está ligado, mas também, por exemplo, do poder público municipal, com os sistemas educacionais e de saúde funcionando a contento, bem como os projetos e programas sociais do município.

É preciso enfrentar o problema da exploração sexual de forma articulada. É neste contexto que vemos como importante a ação do município em defesa da família e da criança, utilizando os instrumentos legais que já dispõe para resolver ou amenizar a questão. O compromisso com o cumprimento do Estatuto da Criança e do Adolescente deve ser o princípio norteador desta ação, de forma que:

❑ busque resolver os problemas das crianças e adolescentes de forma integral, ou seja: saúde, educação, alimentação, moradia, geração de renda etc., não estejam separados em Programas. Observamos que o tema da exploração sexual infanto-juvenil, não perpassa as Secretarias de Governo, quer dizer, quais as políticas da Secretaria de Educação para o tema? Os professores não poderiam ser capacitados para identificar os casos de abuso sexual ou de exploração? Os profissionais de saúde são capacitados para identificar e tratar as vítimas? A Secretaria de Obras, a Secretaria de Habitação etc. Como as secretarias estão articuladas para discutir a temática?

❑ enxergue cada criança ou adolescente como sujeito da sua história e como sujeito único é fundamental. Essa individualidade deve se processar no momento do atendimento, pois a criança que é capturada pelo esquema da exploração apresenta questões diversas, que devem ser atendidas dentro de cada política pública e não se criar uma proposta global e que se "encaixe" a todos.

❑ avance de uma prática assistencialista pra uma prática transformadora da realidade. Por isso a importância de se considerar as famílias neste atendimento, pois a situação de miséria e desemprego com certeza concorrerão para que essa criança não retorne ao lar ou o abandone em pouco tempo.


❑ pense em políticas "duráveis", quer dizer, efetivas e eficientes a ponto de virem se tornar permanentes;


❑ estabeleça parcerias para agregação ao projeto de vários atores sociais, com ações e práticas diversificadas, para não só atuarem nos projetos e programas, mas também para darem sustentabilidade política à ação. Compreendemos a importância da Igreja, dos Sindicatos e das ONGs neste processo.


Acreditando que a criação de Programas organizados e ações qualificadas de profissionais enquanto Educadores Sociais, agindo de uma forma articulada e com competência técnica e profissional, com a ambiência necessária para que se produza na Cidade um Sistema sério de informação sobre a situação socioeconômica das crianças e dos adolescentes, permitindo que as ações sejam direcionadas e que todos os atores envolvidos possam ser convidados a contribuir.
Importantíssimo considerar a valorização da auto-estima, considerando as dimensões afetiva, intelectual e corporal da criança e do adolescente, principalmente as meninas, fragilizadas, na sociedade machista e patriarcal, na sua condição feminina. Ações que possam reduzir a evasão escolar e a repetência também mostram-se necessária, bem como projetos de Iniciação ao Trabalho, voltado para adolescentes, mas com a observância de serem propostas transformadoras e não conservadoras da exclusão.

A ação educativa também tem um papel fundamental na mudança da ambiência social, preconceituosa em relação às crianças e aos adolescentes vítimas da exploração sexual, fazendo com que a comunidade possa criar uma nova visão, positiva e parceira. Enfim, fazer com que a exploração sexual infanto-juvenil, considerada um crime, possa ser enfrentada e combatida porque se constituir numa violência e não uma coisa natural, normal que atraem principalmente garotinhas, interessada na vida fácil que se lhes apresenta por aqueles que os utiliza para
essa marginalização. Precisamos mostrar que esta é uma vida difícil e perigosa para os mais frágeis.

Texto : Educadores Sociais e a Exploração Sexual Infanto-Juvenil - Um Novo Olhar (Altair Lira - Educador Social e Consultor do CEDECA - BA em Educação de Rua)
Foto: Google


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